quarta-feira, 12 de março de 2008

Nascimento

Sabemos quando uma criança nasceu pela sua certidão de nascimento. A criança que chega sempre nos traz alegria e esperança, mas também com ela vem a preocupação e a responsabilidade. A filosofia não surge do nada, mas é fruto de uma longa gestação. A data de seu nascimento não se sabe ao certo, porém, não se pode haver dúvida que com ela surgiram as alegrias e tristezas, esperanças e responsabilidades que são próprias daquele que fazem filosofia. Portanto, o presente texto terá por objetivo, de forma resumida, dar um panorama de alguns dos principais acontecimentos que marcam a bela gestação de nova maneira de ver o mundo.
Conforme John Burnet, em O despertar da filosofia grega, as primeiras preocupações da filosofia grega estão no âmbito da compreensão do mundo. Porém, o autor deixa claro que tal fato não se fecha num não conhecimento do mundo. Os antigos, apesar da escassez de informações, já tinham explorado, de alguma forma, tal terreno.
Para Giovanni Reale e Dario Antiseri, na obra História da Filosofia, há pontos que contribuem significativamente para a compreensão do inicio da filosofia de um povo e de uma civilização. Assim, deve-se fazer referência à arte, à religião e as condições sócio-política do povo.
Antes do nascimento da filosofia, a importância dos poetas para os gregos, seja na educação ou na formação de estrutura do homem, é singular. Homero é uma das principais expressões para tal cultura. Seus poemas não tratam dos mesmos elementos que estão contemplados em outras culturas, mas trás algumas características que se mostram essenciais para a criação da filosofia. Três pontos são apresentados pelos autores como relevantes: 1) a imaginação já se estrutura em um sentido de harmonia, de proporção e de medida, o que na filosofia leva inclusive a categoria de princípios ontológicos; 2) também o poeta pesquisa as razões e as causas dos fatos, levando assim a busca da causa e do princípio; 3) procura apresentar a realidade em sua totalidade, o que conduz a procura do lugar do homem no Universo.
Outro poeta também importante para os gregos é Hesíodo. Em sua Teogonia, ele traça de forma mítica-política (cosmogonia) a gênese do Universo. A partir de tal poema é aberto um caminho para a posterior cosmologia filosófica, na qual a fantasia será deixada de lado e buscará, por meio da razão, o princípio primeiro da qual tudo se gerou.
A religião, por sua vez, é outro elemento pertinente no conjunto da gênese da filosofia grega. Porém, alertam Reale e Antiseri, ao falar de religião grega se faz necessário distinguir entre religião pública e religião dos mistérios. Para a primeira tudo é explicado em função dos deuses. A segunda, por outro lado, tem suas próprias crenças específicas, embora se insira o quadro geral do politeísmo, e em suas próprias práticas. Dentre as mais relevantes está o Orfismo. Para essa filosofia, os estudiosos acreditam que a religião dos mistérios é a que mais contribuiu, dado o fato de que ela introduziu na civilização grega um novo esquema de crenças e uma nova interpretação da existência humana.
Por fim, no aspecto sócio-político, os autores afirmam que as condições dos gregos acerca da liberdade política bem como no âmbito religioso são mais favoráveis do que a dos orientais. De tal forma que isso serve de grande beneficio aos gregos. Foi nos séculos VII e VI a.C. que a Grécia, predominantemente agrícola, passou a desenvolver de forma sempre crescente a industria artesanal e o comercio. O novo modelo econômico alcançou pouco a pouco uma notável força, passando a opor-se a concentração do poder político que estava na mão da nobreza fundiária.
Portanto, percebe-se que, assim como uma criança, a filosofia não nasce do nada, mas é gestada dentro de um processo que intercala com diversos segmentos, como por exemplo os três que foram apresentados: o cultural, o religioso e o sócio-político. Porém, tais fatos não influenciaram apenas no início da filosofia, mas sim durante toda sua história e ainda hoje se renova a partir de tais princípios.


Referência:

ANTISERI, Dario; REALE, Giovanni. História da filosofia. 4° ed. São Paulo: Paulus,1990.

BURNET, Jonh. O despertar da filosofia grega. São Paulo:Siciliano, 1994.
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